O Efeito da Evidência: Como governos de países de baixa e média renda impulsionam e ampliam políticas eficazes de redução da pobreza

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A woman wearing a green head scarf stands holding a child. In the foreground is a counter with a bag of subsidized rice.
Residents purchase rice at subsidized prices at a community hall in Jakarta, Indonesia in May 2024. Photo credit: Wulandari Wulandari, Shutterstock.com

Governos de países de baixa e média renda (PBMR) estão no centro do combate à pobreza. A maioria desses governos investe muito mais em seus próprios programas sociais — que incluem saúde, educação e redes de proteção social — do que toda a ajuda internacional somada. Embora a assistência externa tenha ganhado destaque este ano, os governos dos PBMR são quem assume os compromissos financeiros, define prioridades e tem o mandato e o alcance necessários para promover mudanças duradouras.

Em nossas posições como diretoras executivas do J-PAL América Latina e Caribe (LAC) e do J-PAL Sudeste Asiático (SEA), temos visto que nossos parceiros no setor público demonstram um forte compromisso em buscar novas formas de enfrentar desafios persistentes. Trabalhamos lado a lado com lideranças públicas dedicadas a reduzir a pobreza por meio de programas inovadores, avaliando a efetividade dessas inovações e ampliando aquelas que funcionam.

Essas parcerias demonstraram que o caminho para o desenvolvimento sustentável e a superação da pobreza passa por governos inovadores e eficazes ao redor do mundo — e hoje, mais do que nunca, devemos aprender com esses esforços.

Governos são inovadores comprovados

Muitas abordagens novas e criativas surgem dentro dos próprios programas públicos. Testar e aprimorar essas inovações por meio de avaliações aleatorizadas pode, em alguns casos, transformar completamente o cenário de políticas públicas. Um exemplo são as transferências condicionais de renda (TCR), nas quais famílias recebem recursos com a condição de que invistam na saúde ou na educação de suas crianças. Essa abordagem foi desenvolvida no México e no Brasil nos anos 1990, e desde o início o governo mexicano colaborou com a academia para avaliar os efeitos das TCR — que se mostraram eficazes de forma consistente na redução da pobreza e no apoio às crianças.

Com base nesses resultados, outros governos ao redor do mundo passaram a implementar programas semelhantes, como aconteceu na Indonésia. Hoje, mais de sessenta países já implementaram ou ainda mantêm programas de TCR. Centenas de avaliações rigorosas mediram seus impactos e ajudaram governos a entender o que funciona para aprimorar o desenho dos programas e melhorar seus resultados. Essa base de evidências consolidou as TCR como um instrumento-chave nas políticas de proteção social. Com base nesse sucesso, as transferências não condicionais também se tornaram uma ferramenta cada vez mais utilizada, com base em evidências, para reduzir a pobreza e fortalecer a resiliência das famílias.

Outro exemplo de inovação pública vem da Indonésia, onde o governo identificou que o arroz subsidiado destinado a famílias em situação de vulnerabilidade muitas vezes não chegava aos beneficiários, devido à possível apropriação indevida por intermediários. Para identificar a solução mais eficaz entre diversas opções, o governo trabalhou com pesquisadores para testar diferentes abordagens — e uma mudança decisiva foi descoberta. Uma avaliação rápida mostrou que fornecer às famílias informações sobre seu direito ao subsídio e a quantidade de arroz à qual tinham acesso foi eficaz e de baixo custo. A avaliação foi realizada a tempo de subsidiar decisões orçamentárias, e o programa foi ampliado para alcançar cerca de 15 milhões de lares.

Como podemos apoiar a inovação pública?

Financiamentos, pesquisas e outras parcerias podem apoiar a inovação no setor público. Em nossa experiência, identificamos algumas formas concretas de contribuir com os governos na busca por soluções criativas.

Presença, confiança e uma relação contínua de longo prazo são fundamentais. No exemplo do arroz subsidiado na Indonésia, o J-PAL SEA já trabalhava há anos com um think tank governamental antes da avaliação rápida. Instituições como essa, com visão estratégica, são fontes importantes de inovação: têm maior flexibilidade para testar novas ideias e, por fazerem parte do governo, contam com canais diretos com os ministérios.

Ouvir atentamente as prioridades e necessidades do setor público e oferecer ideias baseadas em evidências que estejam alinhadas a essas prioridades é um componente essencial da nossa abordagem. Em alguns casos, trabalhamos com equipes públicas que estão desenvolvendo novas soluções, como no exemplo da Indonésia. Em outros, as inspirações para soluções informadas por evidências vêm de fora.

Grandes ideias muitas vezes vêm de fora — inclusive de outros governos ou de organizações da sociedade civil. Pesquisas e financiamentos podem ajudar os governos a adaptar, testar e ampliar esses modelos inovadores. Ao considerar ideias baseadas em evidências externas, nossas parcerias no setor público lideram o processo de adaptação, garantindo que as soluções sejam viáveis dentro de suas capacidades institucionais e orçamentárias, e pensando em como integrá-las aos sistemas públicos para alcançar mais pessoas. Nosso papel é apoiar a avaliação de pilotos e variações para que os governos decidam quando e como escalar essas intervenções.

Algumas das abordagens mais eficazes para melhorar vidas e reduzir a pobreza — como o ensino no nível adequado (“Teaching at the Right Level”) ou programas de “Graduation” — foram inicialmente desenvolvidas por organizações não governamentais fora do governo e, com financiamento, pesquisas e apoio da sociedade civil, passaram a ser implementadas por governos em diversos países. Mas isso não acontece automaticamente. Ao envolver lideranças públicas, academia, organizações locais e comunidades em todas as etapas, podemos contribuir para que as soluções sejam incorporadas de forma sustentável aos sistemas públicos.

No Brasil, por exemplo, estamos explorando como governos podem adaptar e ampliar inovações externas para melhorar a educação infantil. Em uma parceria de quatro anos entre a Fundação Bracell, o Itaú Social, o J-PAL LAC e diversas secretarias estaduais e municipais de educação, buscamos identificar, implementar e avaliar rigorosamente programas promissores de pré-escola com potencial de adoção em larga escala — com o objetivo de reduzir desigualdades educacionais persistentes nas diferentes regiões do país. O Itaú Social está sistematizando os aprendizados para orientar futuras implementações.

Apoiando o intercâmbio entre governos. Na Indonésia, no ano passado, o J-PAL SEA reuniu representantes públicos da Indonésia e do Egito para trocar experiências e práticas inovadoras no aprimoramento de programas de proteção social. Recentemente, o J-PAL MENA e a autoridade de seguros de saúde do governo egípcio receberam uma delegação chilena para compartilhar lições sobre o desenho de benefícios em seguros de saúde, como parte de uma série de aprendizados voltados à construção de sistemas universais de saúde eficazes. Esses intercâmbios mostram o enorme potencial dos governos de PBMR para aprender não apenas com a base de evidências, mas também entre si.

Fomentar a inovação com laboratórios públicos e parcerias de longo prazo

Uma forma eficaz e colaborativa de construir confiança, adaptar e testar novas ideias e promover o aprendizado conjunto é por meio da criação de equipes residentes ou de laboratórios públicos integrados à instituições. Esses laboratórios, incorporados à estrutura do governo, funcionam como núcleos de inovação que possibilitam a experimentação e o aprendizado contínuo a partir do próprio sistema, com alinhamento às prioridades nacionais e resiliência frente a mudanças administrativas.

Diagnosticar desafios e identificar e escalar soluções não é um processo linear. O modelo de laboratórios integrados permite que tudo isso aconteça muito mais rapidamente — e o tempo é um recurso essencial para governos.

Na América Latina e Caribe, apoiamos a criação do primeiro laboratório integrado do J-PAL dentro do Ministério da Educação do Peru, em parceria com a Innovations for Poverty Action. O objetivo era testar e ampliar, de forma sistemática, soluções educacionais informadas por evidências e de baixo custo — algumas das quais foram ampliadas nacionalmente. Ao institucionalizar a inovação e o uso de evidências dentro do Ministério, o MineduLAB promoveu uma cultura de aprendizado e adaptação contínua. O sucesso do MineduLAB inspirou a criação de iniciativas similares: atualmente, contamos com mais de 37 laboratórios públicos e parcerias de pesquisa e política com governos em todo o mundo.

Na Indonésia, o J-PAL SEA trabalha em estreita colaboração com o governo há mais de uma década, apoiando diversos ministérios e com muitas parcerias de pesquisa. O Egypt Impact Lab, no Ministério do Planejamento e Desenvolvimento Econômico, e o Morocco Innovation and Evaluation Lab são referências na região MENA. Na Índia, o Ministério do Desenvolvimento Rural assinou recentemente um acordo para lançar um Laboratório de Impacto com foco em gênero. No México, estamos apoiando a criação de novos laboratórios na Secretaria de Planejamento de Querétaro e no Instituto Nacional de Habitação. No Benin, uma nova parceria com o Ministério do Desenvolvimento busca incorporar evidências para alcançar prioridades nacionais de desenvolvimento.

Próximos passos

À medida que o cenário do desenvolvimento global se transforma e os orçamentos ficam mais apertados, financiadores e parceiros devem apoiar os governos de países de baixa e média renda na adoção de abordagens baseadas em evidências para reduzir a pobreza e melhorar a vida da população. Sua capacidade de inovar, avaliar e escalar políticas eficazes é a base para uma redução sustentável da pobreza.

Laboratórios públicos e parcerias de longo prazo são apenas uma das formas de apoiar esse esforço. Na próxima edição de O Efeito da Evidência, nossos colegas Iqbal Dhaliwal e Tithee Mukhopadhyay vão compartilhar estratégias para fortalecer instituições públicas e melhorar a eficiência na oferta de serviços essenciais para as pessoas que mais precisam.

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